TÍTULOS DE CRÉDITO ELETRÔNICOS
O CONTEXTO SOCIAL
Vive-se hoje um momento de constantes transformações. A sociedade apresenta-se cada vez mais dinâmica, globalizada e tecnológica. Essa transição afeta todo um contexto social e os institutos necessitam ser maleáveis para acompanhar essas mudanças. Trata-se da era da tecnologia, onde as relações são mais próximas e rápidas.
Nesse contexto, visando acompanhar essa viragem paradigmática, os títulos de crédito tiveram de ser repensados. A aplicação de alguns princípios, que até então eram absolutos, passaram a ser ponderadas em prol das inovações tecnológicas. O princípio da cartularidade, por exemplo, passou a ser analisado com outros olhos. A visão de que o crédito está materializado em um documento físico deixou de corresponder com a prática comercial.
Dessa forma, o legislador assumiu papel fundamental nesse embate. Por um lado, se viu obrigado a legislar para adequar o ordenamento jurídico à realidade; por outro lado, teve que tomar as devidas precauções para preservar a segurança dos documentos digitais e evitar a criação de títulos sem validade.
A LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
O primeiro passo para adequação da legislação com a era da tecnologia foi dado com a desmaterialização dos títulos de crédito. O art. 889, §3°, do Código Civil estabelece que “o título poderá ser emitido a partir dos caracteres criados em computador ou meio técnico equivalente e que constem da escrituração do emitente”.
No entanto, com o intuito de resguardar a segurança desses documentos, o caput desse dispositivo elenca requisitos mínimos para emissão desses títulos, quais sejam “a data de emissão, a indicação precisa dos direitos que confere, e a assinatura do emitente”.
Ademais, deve-se destacar que outras legislações também se preocuparam em disciplinar o assunto. A Medida Provisória n.º 2.200-2/2001 instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira, visando “garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras”.
A Lei n.º 11.076/2004, por sua vez, possibilitou expressamente a utilização de títulos de crédito na modalidade digital para o agronegócio. Ainda, a Lei n.º 9.492/97, que regulamenta os serviços de protesto de título, estabeleceu em seu art. 8º que “[p]oderão ser recepcionadas as indicações a protestos das Duplicatas Mercantis e de Prestação de Serviços, por meio magnético ou de gravação eletrônica de dados, sendo de inteira responsabilidade do apresentante os dados fornecidos, ficando a cargo dos Tabelionatos a mera instrumentalização das mesmas”.
Por fim, o Enunciado n.º 462 da V Jornada de Direito Civil do CJF, dispôs que “[o]s títulos de crédito podem ser emitidos, aceitos, endossados ou avalizados eletronicamente, mediante assinatura com certificação digital, respeitadas as exceções previstas em lei”.
A DOUTRINA E A JURISPRUDÊNCIA
Sobre o assunto, a doutrina é dividida. Uma parte minoritária entende ser impossível a utilização de documentos eletrônicos, seja por razões formais ou de segurança. No entanto, nos parece mais pertinente o posicionamento da outra parte da doutrina, que abraça a teoria da manifestação de vontade para privilegiar a intenção dos contratantes e não o sentido literal da linguagem técnica, em atendimento ao disposto pelo artigo 112 do Código Civil.
Em conformidade com essa segunda vertente doutrinária, está o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que já fixou entendimento no sentido da executividade de títulos eletrônicos. A título demonstrativo, menciona-se os Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 1.024.691, de relatoria do Ministro Raul Araujo, no qual restou decidido pela exeqüibilidade e validade da duplicata virtual. O Ministro considerou que na ausência de documento físico, a duplicava deve estar acompanhada de documento hábil comprobatório da entrega e recebimento da mercadoria (EREsp 1.024.691/PR, Rel. Min. Raul Araújo, Segunda Seção, j. 22.08.2012, DJe 29.10.2012).
CONCLUSÃO
Em síntese conclusiva, pode-se dizer que a desmaterialização dos títulos de crédito é uma conseqüência do comércio eletrônico, possibilitando a criação de títulos não documentados em papel. O legislador, visando acompanhar as transformações sociais, positivou essa possibilidade em diversos diplomas legais. Em seguida, a jurisprudência se mostrou pacífica sobre o assunto, conferindo maior segurança jurídica para que os títulos de crédito eletrônicos sejam comercializados regularmente.